Entrevista – Secretário de Cultura Albino Rubim (Parte Dois)

Se na parte um de nossa conversa com o Secretário de Cultura do Estado da Bahia Albino Rubim focamos questões envolvendo crítica de arte e cinema baiano, agora na parte final o enfoque foi mais amplo. Conversamos sobre o projeto Verão Cênico, sobre o projeto de expansão do Teatro Castro Alves, sobre a Biblioteca Pública do Estado e por fim sobre o processo de adaptação pelo qual passou a sua gestão.

Sem mais demoras, fiquem com os melhores momentos desta interessante conversa.

Cabine Cultural – Nós queríamos falar do Verão Cênico, projeto da Fundação Cultural (Secult). Vimos muitos elogiarem, mas alguns também reclamaram de problemas. Como o senhor analisa esta edição do projeto.

Albino Rubim – Fizemos uma avaliação do Verão Cênico, convidando uma série de pessoas do campo teatral para participar. No geral as pessoas consideraram o projeto muito positivo, até por esta questão da acessibilidade, de não ficar restrito a Salvador e de colocar o teatro baiano para um público mais ampliado. Houve duas controvérsias: o primeiro ponto nem é controverso, pois eles acharam que deveria ter tido mais recursos e achamos isso correto. Nós fazemos o que é possível, mas essa questão de ter mais recursos é concordante, até mesmo para o Verão Cênico ter uma dimensão maior, pois é um projeto bonito. E a controvérsia era com relação ao pagamento do ingresso, se o público deveria pagar aquele valor simbólico (R$ 1) ou não, se isto avilta o mercado baiano de teatro ou não. E é uma discussão que acho que tem sentido, não é algo sem sentido, imagina. Acho que por um lado é dever do Estado subsidiar uma série de campos culturais, porque se não houver este subsidio estatal esses campos não sobrevivem. E não é algo peculiar do Brasil, se você pegar o teatro de vanguarda, verá que em lugar nenhum do mundo ele sobrevive com as próprias pernas. Música experimental: a mesma coisa. Uma série de áreas das culturas populares também. Ou o Estado financia ou morre, porque a iniciativa privada não vai financiar isso. Não vejo a iniciativa privada bancando teatro experimental, que tem um público super reduzido, que não possui nenhuma repercussão de mídia. Então acredito que haja áreas que o Estado tem que bancar, mas por outro lado, tem outras áreas que o Estado nem deve entrar muito, pois são áreas bem comerciais que possuem dinâmica própria e que por isso deve-se ficar longe, ajudando somente com o que for necessário, até mesmo para não atrapalhar essa dinâmica. E tem uma outra área que acho que temos que estimular a criação de um mercado. No caso específico do teatro… O que acontece com o teatro da Bahia e em parte com o cinema da Bahia? O pessoal do teatro não gosta muito que eu diga isso, mas nós não temos propriamente um teatro profissional, no sentido forte da palavra, isso não é desmerecendo a qualidade do teatro. O que quero dizer é o seguinte: nós não temos uma quantidade significativa de pessoas que vivam do teatro. As pessoas que vivem de teatro na Bahia são muito poucas. Então quando eu falo profissionalização não tem relação alguma com a qualidade, mas sim de ampliar o número de pessoas que vivam do teatro.

CC – Criar um mercado… 

AR – Sim, ter um mercado. O que é que mantém a cultura? Existem três fontes de manutenção da cultura. Uma é o Estado financiando. E ninguém vai achar que haverá uma profissionalização do teatro com o Estado bancando. Pode-se apoiar e ajudar, mas não pode bancar todo um campo do teatro que está fora do Estado, que é da sociedade civil. Isso seria uma loucura completa. Outra é a iniciativa privada colocando patrocínio. Veja, cerca de 60% da verba do FAZCULTURA, que é dinheiro público que a iniciativa privada usa, vai para música. E se deixarmos, vai para 70, 80%… porque é a área onde as empresas vêem mais visibilidade, então o teatro tem bem pouco. E mesmo se tivesse mais, eu acho ruim ter um teatro que seja dependente somente do Estado ou somente da iniciativa privada. Eu acho que as áreas culturais devem ter uma dependência do seu público, devem ter um público que as mantenha. Eu nem digo o teatro experimental, porque não vejo público para mantê-lo, mas falo do teatro mesmo, que deveria ter um público, que se não mantivesse totalmente, ao menos bancasse uma parte do teatro. Isso porque é muito ruim essa relação de dependência somente com o Estado ou somente com a iniciativa privada. A equação ideal seria aquela que fizesse o teatro viver dependendo um pouco do público, um pouco do Estado e um pouco da iniciativa privada. Isso garantiria uma independência maior do teatro, porque hoje em dia grande parte do teatro está presa aos patrocínios de empresas e criou uma dinâmica ruim no teatro brasileiro essa estrutura de leis de incentivos. Veja: um produtor de teatro conseguiu um projeto dentro da lei de incentivos, captou e fez a peça. Para ele é mais vantagem (no sentido estritamente comercial) que ele alongue essa peça para uma temporada grande ou que ele deixe essa peça e vá fazer outro projeto, outra peça e capte recursos? Onde é que ele ganha mais? Eu não tenho dúvidas que é ele largando essa peça e fazendo outra. Então o que está acontecendo no Brasil é que as temporadas de teatro estão cada vez menores (o que é um escândalo), mas que não é algo sem razão, pois são as leis de incentivo que estão nos levando para este cenário, porque é mais negócio para o produtor fazer isso. E a controvérsia era sobre se deveríamos cobrar dez reais, ou mais, ou menos. Muita gente elogiou o valor de R$ 1, mas muita gente criticou. É um tema complexo.

CC – Nos fale um pouco sobre o projeto de expansão do Teatro Castro Alves.

AR – Quando eu cheguei à secretaria o processo dele já havia sido concluído. Foi um concurso nacional, coordenado pelo Instituto dos Arquitetos, uma coisa muito boa porque atualmente o Estado só faz licitação visando o preço mais barato e esse concurso público era de qualidade dos projetos. O projeto é lindíssimo, pois preserva muito a arquitetura existente, não é uma reforma que vá contra isso. Vamos ganhar uma sala sinfônica, que é fundamental, com 500, 600 lugares, vamos ganhar um cinema, vamos requalificar a Concha Acústica, a sala principal. Vamos utilizar sistematicamente o teatro como local de formação, fazendo dele um teatro meio escola. Quando cheguei já conhecia o projeto, já era fã dele e nas conversas que tive com o governador percebi que ele era também totalmente fã deste projeto. Uma das coisas que ele quer fazer – conseguir ou não é outra coisa – é essa reforma do teatro. A reforma é muito cara, quando cheguei aqui estava orçada em 40 milhões, hoje está em 75 milhões. É muito dinheiro e a gente está correndo atrás para conseguir os recursos. Conseguimos, e o governador teve um papel importante nisso, uma emenda de bancada que nos forneceu 21,5 milhões. Tem também a previsão de recursos de um empréstimo internacional para o teatro que o Governo da Bahia tomará. Colocamos este projeto no ministério, conversamos com a ministra e estamos negociando com uma empresa grande e nacional – que não quero dizer qual é neste momento – para que ela entre com uma parte dos recursos, algo em torno de 10 milhões. Então tem uma série de possibilidades.

CC – Mas com risco de associação de marcas? Ou seja, a Sala do Coro ou a Concha Acústica pode ter que mudar seus nomes por conta de parcerias com a iniciativa privada?

AR – Não, nunca faríamos algo assim com o teatro. Nós imaginamos a entrada de capital de empresas, bancos, estatais, e como contrapartida teríamos um lugar onde os homenagearíamos, mas nunca colocar algo do tipo: Teatro Castro Alves do Banco do Brasil.

CC – Falando da Biblioteca Pública do Estado, que consome grande parte da verba da Secult, até porque é um complexo bem grande, com muitos eventos por dia, semana. Sempre temos a sensação de que essa estrutura é subaproveitada, por uma série de fatores. Queria saber se o senhor compartilha dessa ideia e se há algum projeto para ela.

AR – Acho que ali temos uma dificuldade que é a seguinte: ali é o local mais perfeito de Salvador para se ter imediatamente um centro cultural, pois você tem teatro, tem cinema, tem auditório, tem locais para exposição, tem várias coisas ali. A questão é que existem vários setores da secretaria que gerenciam aquele espaço, então não temos uma visão plena daquilo. E para avançar nessa ideia de ser um centro cultural, a gente deveria ter uma gestão unificada, para pensar mesmo enquanto um espaço articulado, com programações articuladas, porque hoje em dia cada um dos setores cuida de suas programações, então é algo totalmente fragmentado e isso não se configura em um centro cultural. Temos que avançar nisso e a primeira questão é trabalhar a ideia de gerenciamento e articulação. Eu acho que melhoraria muito se desse este passo.

CC – Mas cabe a quem dar este passo?

AR – Cabe a secretaria de cultura. E o empreendimento dos setores que residem ali para ver como é que se faz um centro articulado. Mas assim, saindo a Dimas (Diretoria de Audiovisual) como a gente está pensando, as coisas começam a ser facilitadas. Mas não é algo que deva acontecer imediatamente não.

CC – Par fechar, nós queríamos saber um pouco do processo de adaptação pelo qual o senhor passou. A secretaria de cultura era comandada por Márcio Meirelles, que apesar de experiente na área de gestão, é ligado à classe artística. E agora é comandada pelo senhor, que possui um viés mais academicista. Houve alguma cisão neste sentido?

AR – A concepção que tenho possui proximidades com a de Márcio, mas também possui diferenças. E essa questão da academia me ajuda muito… agora veja, na verdade eu não sou uma pessoa que veio da academia. Eu tenho me dedicado nos últimos anos… minha tese de doutorado é sobre políticas culturais e eu tenho me dedicado nisso desde 2005. Eu saí mais da área de comunicação e tenho me focado na área de cultura, então eu dou aula na graduação e na pós-graduação de políticas culturais. E tive uma experiência que foi muito importante para mim que foi no Conselho de Cultura, e eu fui presidente do Conselho de Cultura. Eu diria o seguinte: essa experiência acadêmica, estudar políticas culturais no Brasil e em outros países me forneceu uma bagagem fundamental para eu estar aqui. Grande parte das coisas que eu quero implementar, grande parte das coisas que eu penso vieram daí. E devo dizer que eu aceitei vir para a secretaria por dois motivos: primeiro é porque concordo com o governo Wagner (Jaques Wagner), sou petista e era importante estar aqui colaborando com este governo. E o segundo motivo é que pelo fato de estudar políticas culturais e trabalhar com isso, se tornou um desafio maravilhoso para mim de como aquilo que eu penso pode ser posto na prática.

* Fotos: Cristiana de Oliveira e Luis Fernando Pereira

Uma resposta para “Entrevista – Secretário de Cultura Albino Rubim (Parte Dois)

  1. MUITO BOM SABER DA SECULT ATRAVÉS DESTA REVISTA ELETRÔNICA, PARABÉNS LUIS FERNANDO E CRISTIANA.

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