A Cidade que Queremos – 27 de fevereiro de 2012

No último dia 27 de fevereiro, alguns movimentos sócio-culturais de Salvador resolveram se mobilizar na busca da resposta para uma das questões mais importantes de hoje para todos os soteropolitanos: qual cidade nós queremos no futuro?  Há duas formas de respondê-la, podendo ser por um viés mais teórico/filosófico ou por uma perspectiva mais prática, com ações mais específicas e pontuais. Naquela noite houve um misto destas duas possibilidades, tornando o evento de um simbolismo ainda mais salutar.

Na mesa, seis convidados passaram a expor suas ideias, argumentos, críticas e dúvidas sobre o projeto atual da prefeitura da cidade. A LOUOS (Lei de Ordenamento do Uso e Ordenamento do Solo) definirá de alguma forma (ou muitas formas) o futuro urbanístico de Salvador, e por isso pensar e repensar seus artigos torna-se uma ação não somente recomendada, mas, sobretudo obrigatória.

E assim, os cidadãos desta cidade estão desde semanas atrás convocados a refletir sobre a Salvador das próximas décadas. Esse ato de reflexão já é muito válido, mas o ideal é que como consequência dela haja um conjunto de ações que vise melhorar gradativamente nossa cidade, e nossa auto-estima, tão machucada nos últimos anos. E aqui não se faz somente uma crítica direcionada. Não há oposição a governo municipal, estadual ou federal, mas sim a todos que direta ou indiretamente contribuíram para o estado atual de abandono que a cidade vive.

Voltando ao evento, Clímaco Dias, professor do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA), começou sua fala fazendo um discurso crítico sobre o nosso Centro Administrativo da Bahia (CAB), que mais parece ser um elefante branco, sem finalidade estratégica alguma. Ao final, disparou: “Não existe LOUOS nas áreas pobres de Salvador!”

Logo depois foi a vez de Daniel Colina, arquiteto. Ele mencionou o fato deste evento ser uma novidade, para depois falar de planejamento participativo. Afirmou que a justiça e a sociedade estão evoluindo e como exemplo mencionou o movimento Ocupe Wall Street. Ver aqui

Em seguida foi a vez de Waldir Santos, do Movimento Desocupa, tomar a palavra. Ele era talvez a pessoa mais esperada deste evento, por conta de todo o contexto que o Movimento Desocupa se inseriu nos dois últimos meses. Foi através do movimento que foi desencadeado o processo de discussão sobre o futuro da cidade. Porém, sua fala, ao menos num primeiro momento, chegou a ser um pouco frustrante. Didático demais, ele preferiu passar o tempo ensinando uma série de coisas que acredito já ser de conhecimento de todos que estavam ali presentes. Parecia mais uma revisão para prova de concurso público. Perdeu-se um bom tempo, que poderia ter sido mais bem aproveitado, mas que ao invés disso, foi utilizado – por exemplo – para diferenciar plebiscito, referendo e iniciativa popular. Ainda assim, foi válido. E é sabido que o trabalho que ele e o Movimento Desocupa vem desempenhando é merecedor de muitos elogios.

A fala seguinte, de Marli Carrara (União Nacional por Moradia Popular), foi das mais aplaudidas. E das mais interessantes também. Como resumo de seu discurso fica a ideia de que a responsabilidade por esta nossa situação de caos urbano é de todos: engenheiros, arquitetos… Todos contribuíram de alguma forma para o que acontece hoje na cidade.

Logo após, Raimundo Nascimento (Rede CAMMPI – Comissão de Articulação e Mobilização dos Moradores da Península de Itapagipe) voltou-se para um dos assuntos mais dignos de atenção na Salvador de hoje: a situação no Quilombo Rio dos Macacos. Ver aqui

Quem ficou com a incumbência de fechar a primeira parte do evento foi o arquiteto Nivaldo Vieira de Andrade Junior, Presidente do IAB-BA.

O seu discurso foi sem dúvida o que mais entrou propriamente nas nuances do tema, pois se restringiu somente a analisar tecnicamente o projeto de futuro da cidade de Salvador, e mostrou ponto por ponto como este atual projeto apresenta falhas e não é condizente com os anseios da maioria da população.

Ele falou de questões como sombreamento na área da orla, do Conselho Municipal de Cidades, que foi criado, mas nunca fora ativado de fato. Enfim, deu uma boa aula, situando todos os presentes do que está realmente acontecendo na cidade.

Para não alongar mais, o texto ficará restrito até este momento do evento. Logo após foram abertas para perguntas do público presente, que vale destaque, lotou as dependências do Teatro Vila Velha.

Parabéns ao teatro, que demonstra com isso uma preocupação social que todos os movimentos culturais de Salvador também deveriam possuir. Parabéns aos movimentos sociais, que fazem a discussão andar e assim as ideias sobre o que é melhor para a cidade acabam sendo mais produtivas e com menos chances de erros. Parabéns para todos que estiveram lá, contribuindo de uma forma ou de outra para o enriquecimento da democracia soteropolitana. Que isso acarrete bons resultados em curto, médio e longo prazo para Salvador. Ela merece.

* Fotos: Cristiana de Oliveira