Panorama Internacional Coisa de Cinema – Segundo Dia

Caverna dos Sonhos Esquecidos, de Werner Herzog

Segundo dia do Panorama Internacional Coisa de Cinema foi marcado pelo início da Mostra Competitiva Nacional, que premiará o melhor curta-metragem e longa-metragem do evento. Mas não foi somente isso. Tivemos também exibições da Mostra Panorama Internacional e da Homenagem à Pornochanchada, um dos grandes destaques desta edição.

Confira também: abertura do Panorama

HERZOG
O cineasta alemão brindou os espectadores do Panorama com o documentário Caverna dos Sonhos Esquecidos, feito com tecnologia 3D. E tal como Wim Wenders, em Pina, e Martin Scorsese, em Hugo, Herzog se esforçou para dar um novo ânimo ao formato. Pode-se dizer que o objetivo foi inteiramente alcançado, já que o filme consegue unir a plasticidade única das imagens oferecidas com uma série de questões envolto da história da arte. Unir beleza e relevância histórica em um único projeto é tarefa das mais árduas e Herzog pode se dar por vitorioso.

O mote do filme é o mais antigo registro de pinturas pré-históricas de que se tem notícia. O contexto da história recai sobre a década de 1990, quando exploradores descobriram a caverna Chauvet, na França. O local é hoje um dos maiores patrimônios da humanidade. Ao sul da França e evadida por um grandioso arco natural formado na rocha, a caverna Chauvet guarda as figuras mais antigas já produzidas pelo homem, há 32 mil anos. Tão logo veio a descoberta o governo da França entendeu a relevância do lugar e atribuiu uma série de regras rigorosas, pois a ação de visitantes poderia estragar as pinturas. Sendo assim, uma porta de metal bloqueou a entrada, e estando lá dentro, só se pode andar sobre uma plataforma com 60 centímetros de largura, sendo proibido tocar em qualquer coisa. Foi nesse ambiente que a equipe de Herzog conseguiu captar as imagens.

O sentimento impregnado na experiência visual que o documentário proporciona é das mais poderosas. Herzog consegue transformar o que seria mais um episódio do Discovery Chanel em um dos mais bonitos exemplos de como se utilizar de boa tecnologia para engrandecer a arte de contar uma história. E Caverna dos Sonhos Esquecidos conta não somente uma história, mas a história, além de induzir todos a exercitarem a imaginação e vislumbrarem o mundo de 32 mil anos atrás. É uma ideia romântica, mas que funciona bem no documentário.

MOSTRA COMPETITIVA
A Mostra Competitiva teve início na noite desta sexta-feira e com ela alguns dos melhores trabalhos de curtas e longas-metragens do país serão exibidos ao público. Primeiro filme da noite, o curta-metragem Porcos raivosos, de Leonardo Sette (As Hiper Mulheres) e Isabel Penoni, trabalha com a encenação da história mítica que dá origem à festa Jamurikumalu, o maior ritual feminino do Xingu. Com elementos que misturam formatos (documentário e ficção), o filme bem da verdade não carece de rótulo algum, já que o trabalho visual conquistado é de beleza única, com um poder imagético surpreendente. Entrar de tal forma no seio de uma comunidade indígena é trabalho dos mais árduos e somente por isso os realizadores já merecem muitos aplausos. Mas eles vão além e o trabalho de câmera é dos mais interessantes, chegando a momentos que a sensação é que ela (a câmera) dança junto com as mulheres, fazendo parte daquele grupo. Grande projeto, belo início.

Porcos Raivosos

Logo depois, Daniel Lisboa apresenta o seu A Anti-Performance, uma nova investida do cineasta na vida e no trabalho do artista baiano Jayme Figura. Jayme é um dos mais emblemáticos nomes da cena sócio-cultural da cidade de Salvador e o curta-metragem acompanha-o em viagem rumo a São Paulo, capital mais cosmopolita do Brasil, que aparentemente não veria com olhos tão estranhados a figura de Jayme. Pois Daniel consegue transpassar para todos que o estranhamento proporcionado por algo que é diferente do ‘comum’ ainda é forte no ser humano, e muitas vezes maléfico. Se afrontar com algo exótico, com algo que lhe é estranho pode ser uma experiência válida, positiva, negativa… São variadas as opções e a câmera de Daniel consegue expor todas essas possibilidades, seja nas expressões de todos que se deparam com Jayme, seja nos poucos momentos em que há diálogos (a conversa com o comandante do avião é dos mais significantes). Trabalho interessante, que aprofunda mais a relação do cineasta com o artista único que é Jayme Figura.

Por último tivemos o longa-metragem Esse Amor que nos Consome, de Allan Ribeiro. Na história Gatto Larsen e Rubens Barbot são companheiros há mais de 40 anos. Eles acabam de se mudar para um casarão abandonado no centro da cidade, onde ensaiam com sua companhia de dança. O dia a dia da dupla envolve a criação artística e a crença nos orixás. Através da dança, eles marcam os territórios do Rio de Janeiro.

Esse Amor que nos Consome

Há de se mencionar que o título do filme não reflete a história contada, e essa menção tem a função de não frustrar os mais desavisados que iriam com o intuito de assistir um conto de amor incondicional de um homem com sua alma gêmea, ou algo do tipo. O título é uma referência ao espetáculo que está sendo produzido pela companhia de dança de Gatto Larsen.  Esse amor que nos consome faz uso do lirismo da dança como um dos motes da história e aliado a isso há uma utilização bem forte de simbolismos. Tal como Porcos Raivosos, há uma mistura de formatos que em momentos podem confundir (seria uma ficção ou um documentário?). Trabalho bem produzido, que tal como Pina, traz a dança como real protagonista da narrativa.